Quem foi Selarón

Jorge Emílio Perez Moralez, mais conhecido como Selarón, foi um pintor e ceramista autodidata. chileno, nascido na região de Limache em 1947 e falecido no Rio de Janeiro em janeiro de 2013, aos 66 anos de idade.

A curiosidade de Selarón foi aguçada ainda nos anos 50, quando teve a oportunidade de fazer uma visita para Buenos Aires aos 10 anos, onde decidiu conhecer o mundo. Aos 17 anos viajou escondido num navio até chegar na Europa, vivendo de aulas de tênis onde pudesse. Segundo o próprio, viajou por 57 países pelo mundo, principalmente pela Europa, passando até mesmo uma temporada na Índia, até que finalmente decidiu fincar suas raízes no Rio de Janeiro.

Escolheu o Rio de Janeiro por ser uma das poucas cidades do mundo, ao lado de Nova York, onde existiam “mulheres negras grávidas”, igual as que desenhava em suas telas e azulejos. Chegou ao Rio de Janeiro no final dos anos 80, mas só fixou residência na Lapa nos anos 90. Passou a trocar e vender seus quadros em muitos dos restaurantes da região. O que acabou se tornando uma jogada inteligente, ao mesmo tempo em que conseguia alimentação na região, também conseguia expor seu trabalho para os turistas que passavam por aquela área do Rio antigo.

No ano de 1994 iniciou o trabalho que se tornaria sua obra máxima. Autodidata, iniciou os processos de aplicação dos azulejos na escadaria da rua Manoel Carneiro, que antes era conhecida como Escadaria do Convento de Santa Teresa. O processo se iniciou também com a instalação de um conjunto de banheiras que foram utilizadas como jardins. A escadaria foi definida pelo próprio Selarón como “minha homenagem ao povo brasileiro que até mesmo o grande Gaudi vai ficar com inveja”. Se nos 215 degraus que se espalham em 125 metros de altura, o artista quis homenagear o Brasil, nas paredes laterais usou o vermelho, sua cor preferida e também cor da bandeira de seu país, o Chile.

Selarón viveu de vender sua arte que, gradativamente, crescia em importância com o número de turistas crescendo. Quando a escadaria apareceu em clipes musicais de artistas famosos, enciumado, arrancou alguns azulejos e demarcou o espaço: Escadaria Selarón, para que todos tivessem acesso a informação, sua assinatura estava ali, para que todos pudessem ver e fotografar.

Em 2004 Selarón foi entrevistado por Jô Soares em seu programa noturno de entrevistas. Tal aparição ampliou a fama de Selarón e da escadaria, que passou a ter um número maior de turistas. O que acabou contribuindo para o tombamento provisório da escadaria. Por volta de 2012 a escadaria já havia se tornado um ponto famoso no turismo carioca. Selarón havia se tornado figura conhecida nos jornais da época, todavia, a vida pessoal havia entrado em colapso.

Selarón foi encontrado morto na manhã, era quinta feira, 10 de janeiro de 2013. Uma investigação foi iniciada pela Polícia Civil na ocasião onde qualquer suspeita de assassinato foi descartada. A causa de sua morte foi apontada como suicídio pelos investigadores.

Jorge Selarón foi apontado como o maior artista popular do Rio por diversos sites da época que cobriam sua arte e o desenvolvimento de seu trabalho na escadaria, trabalho esse que o mesmo chamava de sua “grande loucura”. Selarón deixou uma marca profunda na cultura e na identidade do Rio de Janeiro. Construiu algo muito além do número de degraus e da altura da escadaria. Deixou algo com a cara da cidade do Rio de Janeiro – algo mutante, anárquico, que, ainda que estivesse ao alcance de todos, só pôde ser sonhado e, dessa forma materializado, por ele.

Sua história

1947

Nasce Jorge Emílio Perez Moralez, em Limache, Chile.

1957

Primeira viagem internacional, para a Argentina, o pequeno Jorge se encanta e decide ali que iria conhecer o mundo.

1964

Com o objetivo de cumprir seus sonhos, viaja de maneira clandestina em um navio para a Europa.

1977

Selarón começa a inserir a figura da mulher negra grávida em suas telas. Segundo o mesmo, por conta de uma questão pessoal que viveu e que o marcou profundamente.

1983

Selarón chega ao Rio de Janeiro no dia 19 de setembro de 1983.

1990

Se estabelece na Escadaria do Convento de Santa Teresa.

1994

Inicia a aplicação dos azulejos na escadaria.

2000

A banda irlandesa U2 lança a música Walk On, o clipe que só foi lançado um ano depois contém cenas da banda subindo a famosa escadaria da Lapa. É nesse ano que Selarón começa a fazer a aplicação dos azulejos vermelhos nas paredes da escadaria.

2005

A escadaria se torna tombada, ainda que de maneira provisória, por força do Decreto número 25273 de 19 de abril de 2005, por seu valor cultural.

2006

O rapper Snoop Dogg gravou, ao lado de Pharrell Williams, o clipe Beautiful.

2010

Foi gravado o curta metragem “O Vermelho de Selarón”, com direção, roteiro e montagem de Rafael Bacelar e Rodrigo Gomes, 2º lugar no Curta Criativo, 2010 e Melhor filme – I Festival Curta a idéia, Rio de Janeiro, 2011.

2013

O artista plástico é encontrado morto na escadaria que leva seu nome. As investigações que se sucederam ao fato apontam que o artista cometeu suicídio. Estava fechado ali o ciclo da Escadaria Selarón.

2015

A Escadaria Selarón se torna finalmente um Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro, por força da lei municipal número 5927 de 2015.

2019

A Escadaria é reconhecida como o terceiro ponto turístico mais visitado do Rio de Janeiro, ficando atrás apenas do Corcovado e da Floresta da Tijuca.

Selarón e o Rio de Janeiro

A relação de Selarón com o Rio de Janeiro sempre foi um ato constante de troca genuína entre o espaço e o artista. Em mais de uma ocasião o artista deixou claro sua impressão sobre a cidade que o acolheu:

O Rio [de Janeiro] é a cidade mais bonita do mundo. Não por sua beleza física, não precisa de sua beleza física. O Rio de Janeiro é bonito por causa de sua gente, pelo jeito de ser do carioca, por que o jeito de ser do carioca só existe aqui, não existe em nenhum lugar do mundo. E aqui, no Rio, é a única cidade do mundo que tem 365 dias agradáveis.

– Selarón em entrevista ao documentário “A Grande Loucura”.

A gratidão de Selarón se tornou tão grande que em 1990 começou a montar o que viria a se tornar maior obra fruto de seu talento e gênio criativo. O próprio deixou gravado no painel de azulejos que se encontra na base da escadaria o que sentia sobre a obra que construía com suas próprias mãos e, ocasionalmente, com a ajuda de algumas pessoas amigas que vivenciavam a entrega de Selarón com sua obra.
O painel que se encontra em dois idiomas, português e inglês, destaca logo no início a homenagem do artista: Esta obra de arte começou no ano de 1990 como uma grande homenagem minha ao povo brasileiro, usando as cores da bandeira do Brasil, verde-azul-amarelo. Uma homenagem ao povo brasileiro, em especial, ao povo do Rio de Janeiro por quem foi acolhido. Essa questão pode ser percebida na azulejaria especialmente desenvolvida por Selarón com a sua famosa mulher negra grávida em que deixa mensagens para famosos de todo o Brasil mas também para os diversos anônimos que conviveram com ele na escadaria e o visitavam. A escadaria é um presente do artista ao povo simples do Rio de Janeiro.

A escadaria

O formato de escadaria pode confundir muitos mas ela é um logradouro e tem nome oficial e todo o mais. Oficialmente ela é a rua Manuel Carneiro, mas mesmo antes poucos conheciam ela por esse nome. Desde muito tempo a escadaria é um dos acessos ao Convento de Santa Teresa, outro marco da história do Rio de Janeiro fundado em meados do século XVIII pelas irmãs Jacinta Rodrigues Aires, a Madre Jacinta de São José e sua Francisca Rodrigues Aires ainda nos tempos do 1º Conde de Bobadela, o governador Gomes Freire. O tempo passou e o convento sempre marcou a paisagem da região. Com os avanços urbanísticos na cidade, não demorou para ocorrerem reformas e a escadaria ganhar uma versão mais atualizada, em alvenaria. Em registros de 1950 a Escadaria do Convento já aparece em alvenaria.

Mesmo no início anos 90 ela ainda era conhecida como Escadaria do Convento de Santa Teresa. Poucas pessoas conheciam ela pelo nome oficial. Com as obras sendo iniciadas por Selarón, a escadaria começou a ganhar notoriedade, mas ainda assim, algo discreto. Em 2006 o rapper Snoop Dogg ao lado do também cantor e compositor Pharrell Williams, compuseram a música Beautiful e com isso, os olhares do mundo buscavam a escadaria, mas não a do convento, buscavam a escadaria onde o clipe do rapper foi gravado. As pessoas buscavam a Escadaria do Snoop Dogg,

Mas a Escadaria não era do rapper e Selarón tratou de alterar a situação. Num final de semana arrancou alguns azulejos do segundo lance da escadaria e escreveu a famosa apresentação: Escadaria Selarón.

Se antes a escadaria tinha era identificada por estar histórica e geograficamente conectada ao convento, e depois, passou a homenagear alguma ilustre personalidade com a gravação do clipe, Selarón precisou assinar sua obra máxima, sua grande loucura, para entrar de uma vez por todas no imaginário da cidade do Rio de Janeiro e de todos os turistas que passaram por ela.

MAIS UM POUCO DE SELARÓNGaleria de Azulejos